domingo, 26 de julho de 2009




A SUA HISTÓRIA

" A cidade da Jurema" -Os índios sempre foram lacunas na historiografia paraibana, portanto fazer uma história que remonta a uma aldeia indígena do litoral da Paraíba não é nada fácil, pois as informações são poucas e as que existem são lacunares e muitas vezes contraditórias. Ao tentar construir a História da Vila de Alhandra, partimos da idéia de que o índio é o motivo de sua elevação à primeira Vila da Paraíba, se tornando parte principal dessa trama. Contudo, o reconstruir da História desse povo se faz no remonte de histórias e na análise dos discursos, na tentativa de entender esses primeiros habitantes do território que hoje corresponde a Paraíba. Na Paraíba a população estimada, no século XVI, era de 100 mil índios (MELO, 1999).

No litoral viviam os índios pertencentes à Tribo dos Tupis, os quais se dividiam em dois grandes grupos, os Tabajaras e os Potiguaras. Já na região do interior, ao longo dos rios do Peixe, Paraíba e Piancó, se fazia presente a Nação dos Kariris, que tinha uma grande variedade de tribos, enquanto no sertão, Seridó, Curimataú e parte dos Kariris Velhos, concentrava-se o grupo dos Tarairús. Essas informações provêm de José Elias Barbosa (1984), um dos poucos a falar da existência do grupo dos Tarairús na Paraíba.Os índios que viviam no território do atual Estado da Paraíba viviam da caça, pesca e coleta, praticando uma agricultura primitiva, basicamente de mandioca, milho, fumo e algodão. A maioria deles eram nômades e sua organização social se dava


... sob a forma de tribos, compostas por varias aldeias, que reuniam os indivíduos em função de algum tipo de trabalho ou da guerra. A organização do trabalho se baseava no sexo e na idade dos componentes do grupo [...] As mulheres se ocupavam de todas as tarefas relacionadas com a manutenção da aldeia e com a produção de alimentos para as pessoas que nela viviam.[...] Os homens preparavam a terra para o plantio, derrubando a mata, fazendo a queimada e destocando. Também caçavam, pescavam, fabricavam armas e construíam as casas e canoas. (CAVALCANTI. 1996, p. 20) Vale destacar que todo trabalho era coletivo, assim como a distribuição de tudo o que era por eles produzidos. As crianças eram inseridas na vida da aldeia acompanhando os adultos em suas tarefas. Quanto às tradições essas eram passadas oralmente de geração em geração, de modo que a importância dos mais idosos era de grande relevância, pois eles eram os responsáveis pela transmissão dos costumes, das tradições, dos rituais, pela manutenção da cultura indígena (Op. cit., p. 20). Isso é um pouco, ainda que superficial, do que podemos hoje saber desses povos que aqui moravam antes da chegada dos colonizadores, pois a partir da chegada desses, nada seria como antes, o contato dessas diferentes culturas, mudou não só a vida dos índios, mas também a própria vida do europeu.


Com a chegada dos portugueses, a vida dos nativos não, de início alterada, pois a principio os colonizadores só exploravam o pau-brasil, utilizando a mão-de-obra indígena, através do conhecido escambo. Porém quando os portugueses decidem povoar essas terras e implantar a agricultura, as coisas começam a tomar outros rumos e os índios começam a sofrer interdições na sua cultura das mais variadas formas. Quando os portugueses perceberam, já em 1534, que não bastavam às expedições esporádicas, e a exploração do pau-brasil não era suficiente para assegurar sua posse, constataram que apenas o povoamento garantiria maiores rendas e evitaria a perda do território para outras potências européias. O Brasil foi assim dividido em capitanias hereditárias. A conquista e ocupação do território da Paraíba se inicia então quando é criada a Capitania de Itamaracá, que se estendia do rio Santa Cruz, hoje Igaraçu – PE, até a Baía da Traição, doada a Pero Lopes de Souza. No entanto, a Paraíba vai continuar sendo uma área pouco cuidada pelos portugueses, onde serão constantes os conflitos entres os nativos e colonizadores, principalmente os Potiguaras que sempre foram bastante hostis aos portugueses. Em 1574, por um Decreto Real, a Paraíba foi desmembrada de Itamaracá, sendo criada a Capitania Real da Paraíba, cujos limites iam do rio Abiaí à Baia da Traição (SILVEIRA, 1999).

A conquista da Paraíba só foi consolidada em 1585, com a fundação da cidade de Nossa Senhora das Neves (atual João Pessoa), depois de onze anos de expedições e inúmeras batalhas sangrentas entre colonizadores e os nativos locais. Os Potiguaras aliados dos franceses não facilitaram em nada a ação dos colonizadores portugueses nessas terras. O ato considerado fundante da Paraíba foi uma aliança celebrada entre os portugueses e os Índios Tabajaras, cujos personagens conhecidos desse fato são João Tavares e Piragibe. Como aconteceu em todo o Brasil, após a conquista definitiva das terras da Paraíba pelos portugueses foram criadas as aldeias missionárias, a exemplo de Jacoca (atual cidade de Conde), e a dos Arataguis (atual cidade de Alhandra). Nas missões, os índios ficavam sobre os cuidados de religiosos, que vestidos segundo os ideários cristãos levavam os índios à prática dos “bons costumes”, ensinando a educação moral e religiosa. O índio era visto como aquele a ser salvo, pois os consideravam como os “pobrezinhos” que não conheciam a verdade, era dever dos padres mostrar-lhes o caminho do céu. A mentalidade européia e cristã da época, não entendia e nem aceitava o diferente. Nesse sentido, a cultura indígena era vista como algo que precisava ser superado pelo ideário católico, tendo nos jesuítas os primeiros padres missionários a estarem na Paraíba. Segundo Wilson Seixas (1979), os padres jesuítas Simão Travassos, Jerônimo Machado e Baltazar Lopes fundaram residência na região, dando inicio as práticas que se ocupavam na catequese dos índios situados nas aldeias tanto do litoral quanto do sertão. Com a chegada dos franciscanos, que também passaram a se ocupar com os serviços de catequização das aldeias, vieram os conflitos. Os jesuítas acabaram sendo expulsos da Capitania, em 1593, pelo então governador da Paraíba Feliciano Coelho de Carvalho, restando aos franciscanos todo o trabalho missionário da região.


...após a expulsão dos jesuítas cresceu muito na capitania a devoção e o número dos cristãos impulsionados pela grande confiança que tinham os padres franciscanos sobre os quais recaia o peso de muitos serviços nas aldeias, tanto que passaram a ser considerados como os melhores auxiliares na conversão moral e religiosa entre os índios e moradores. (SEIXAS, 1979. p. 47)


Para Seixas (1979) os franciscanos eram melhores na catequização indígena que os jesuítas, inclusive eles eram detentores do afeto dos nativos da região. Neste discurso ingênuo até parece que não havia conflitos e nem resistência por parte dos índios, uma vez que por trás desse conflito entre jesuítas e franciscanos estava um interesse maior, o dos colonos pela mão-de-obra indígena, acabando por desencadear na escravização. Os franciscanos foram assim construindo igrejas e conventos nas aldeias, no intuído de exercer uma maior presença e por isso controle sobre os índios. Assim foi fundada a igreja de Alhandra com a invocação de Nossa Senhora da Assunção, uma das primeiras a ser erguidas em 1740. Sob um estilo barroco rural, a igreja de Nossa Senhora de Assunção já sofreu muitas alterações, porém conserva até hoje muito de sua arquitetura original. Associado a isto, houve a construção da igreja e do convento pelos próprios índios, o que corroborou no deslocamento de sua cultura e de sua religião, pela visão e instituição do deus cristão. Sob esta perspectiva temos que “Na Paraíba, as tabas foram sendo esvaziadas, virando aldeias missionárias, manipulados por poucos religiosos... A política colonialista era de misturar os índios de tribos e nações diferentes...” (MELO, 1999, p. 201).

O autor reforça a concepção já discutida que as aldeias, na Paraíba, passaram a ser responsabilidade dos religiosos, onde a política colonialista misturava diferentes aldeias e nações indígenas, demonstrando que sempre que uma nova aldeia era conquistada pelos brancos ela era levada para um outro lugar, este já espaço de índios amansados. A aldeia missionária de Alhandra, ao que parece, sempre recebia novos índios, trazidos de outras partes da Paraíba, principalmente do interior (sertão). Tal fato pode ser percebido quando nos deparamos com os dados: em 1804, Alhandra tinha cerca de 766 índios, no ano seguinte ela já apresentava 1.372 (MEDEIROS, 1999). Segundo Maria do Céu Medeiros, essa faceta dos colonizadores possibilitava a concentração de mão-de-obra indígena, o que se fazia necessário na produção do litoral canavieiro (o sertão paraibano era um território relegado pelo interesse dos colonizadores), na construção de obras públicas, nas lavouras e engenho, enfatizando o índio como um “produto” cobiçado pelas nações. Alhandra era, então, um espaço propício de índios para o trabalho, provindos muitas vezes do sertão, predispostos aos mandos e desmandos das autoridades coloniais. Daí a aldeia missionária ser de extrema importância para os colonizadores europeus, pois tiravam os índios de seu território e levavam para um lugar estratégico, propiciado pelas missões. Estas ações de isolamento e controle dos índios eram bem sucedidas, servindo na pacificação dos índios. A importância da missão indígena de Alhandra foi enfática, pois uma vez a capela construída, a cidade logo foi elevada a Freguesia de Nossa Senhora da Assunção (1749), sendo a segunda freguesia a ser criada na Paraíba. A freguesia de Alhandra era ligada à diocese de Olinda. Após a criação da freguesia, em 1758, o reduto indígena foi tornado vila: “...Em virtude da Carta Régia de 14 de Setembro e Alvará desta data, é elevada a categoria de villa a aldeia de Arataguy, com o nome de Alhandra.” (PINTO. 1977, p. 158). Em 1758 se torna a primeira vila da Paraíba, sendo apenas instalada em 1765. Após Alhandra se seguiram quatro vilas, a de Pilar (1758), a de São Miguel da Baía da Traição (1762), a de Monte-Mor da Preguiça (1762) e a de Jacoca, (atual Conde em 1768). Todas elas fundadas a partir de aldeias indígenas. Percebe-se que todas foram criadas em um curto espaço de tempo, e todas além de serem aldeias indígenas, ficavam também na faixa litorânea. O que nos demonstra um maior controle indígena.

Na medida em que Alhandra deixa de ser uma simples aldeia missionária e passa a ser vila, ela deixa de ter apenas as autoridades religiosas, e passa a ter um controle das autoridades civis. Nesse sentido o índio deixa de obedecer ao padre e passa a obedecer ao capitão-mor e ao capitão dos índios e as demais autoridades civis locais. Alhandra não era, portanto, um lugar de grande expressão, era um pequeno lugarejo. Consta que por volta de 1774, possuía cerca de 620 construções e 1089 habitantes, isso é mais do que a população de Jacoca que, no mesmo ano possuía 445 construções e 744 habitantes. Mas se comparada a Pombal que foi elevada a vila depois, no mesmo ano de 1774 já tinha 2451 construções e 5422 habitantes (SILVEIRA, 1999. p. 33). Contudo a maior razão por ter sido Alhandra a primeira vila foi por certo os índios. Alhandra não surge vila assim, por sua grandeza, desenvolvimento ou por ser um povoado de relevante expressão. Mas sim para atender a uma estratégia da política colonialista, não é de se estranhar que Alhandra irá permanecer por mais de duzentos anos na categoria de vila.

www.alhandra.pb.gov.br/

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